Escurece mais uma vez, procuro me distanciar das trevas, sem pensar estou mergulhado, submerso no negrume dos cabelos da escuridão. Debato-me e de longe ouço passos, surdos, secos e distantes.
De repente, não mais que de repente, vejo em minha frente uma coisa, algo que não sei explicar. Fico ali imóvel, parado e perplexo, não sei se grito, se choro, se clamo.
A voz não sai, as lágrimas caem involuntariamente. Clamo por Deus e em minha frente, com os olhos cerrados, lembro-me de meus amigos, parentes, da tristeza, lembro-me do nada, do vazio, da solidão!
Pergunto-me novamente, o que faço?
O que fiz para merecer tanto pavor?
Abro os olhos e vejo, novamente e ainda, aquilo que não sei o que é!
Rodeada de uma luz intensa, uma luz brilhante que não queima, tampouco cega, uma imagem tão perto, que parece distante. De repente essa imagem que parece se formar, profere em meu pensamento, palavras que não compreendo. Fala em um idioma que não entendo.
Aquela luz incandescente toca-me. Todo pavor, tristeza e agonia se transforma em algo inexplicável, algo surreal, celestial.
Todo aquele medo se transforma em alegria. Cada vez mais próxima de mim, aquela imagem, parece se modelar. Suas silhuetas tão perfeitas, tão simples, tão calmas, em certo instante, percebo-me todo envolvido por aquela estranha luz.
Começo a maquinar e dar significados a cada traço por ela formado. Parece que estou dotado de uma inteligência que nunca tive!
Pareço estar entendendo o que a voz me diz, a voz que outrora estava em meu pensamento.
Penso na morte e na vida, na terra e no céu.
Começo a pensar: será que morri ou estou adormecido? Caí em um sono profundo ou estou no estado sonambúlico do qual os médiuns falam?
Novamente a voz conversa comigo e pareço compreender, a voz é tão calma, tão singela, tão doce...!
-Volte, volte...
Não compreendo o que essa repetição, que se faz constante e como um eco, quer dizer. Qual será realmente o significado seguro de tal palavra?
Não tive até então coragem de me locomover; tomei logo a iniciativa e com prudência e perícia, levantei-me, pois estava a meu ver, sentado sobre algo. Olhei para o lado e após examiná-lo, olhei atentamente para o outro, comecei a reconhecer a mobília simples, longe de ser perfeita, e de estar bem arrumada.
Aquela mobília era do meu quarto, será que estou dormindo no meu próprio quarto e ainda não percebi? Aquela voz, novamente se repete:
- Volte, volte...
Só que desta vez, aquela figura, que agora tenho certeza que é uma mulher, mostra com seu dedo, num gesto humano para baixo de mim, neste instante, um calafrio e um sentimento desconhecido se apossam de mim, fiquei apavorado, fechei os meus olhos, respirei fundo e olhei para baixo!
De repente, subiu-me uma vertigem, uma onda de calor e de frio, um medo terrível! A imagem que vi abaixo de meus pés, me deixou amedrontado. Era o corpo de um homem esticado sobre uma cama e eu estava flutuando alguns metros acima dele.
Após aquele furor, diversas vozes tomavam posse de meu pensamento, falavam em coro, em um tom que me confortava e me livrava de pensamentos negativos.
As vozes diziam:
- Volte, volte..., ainda não é sua hora, volte...
Olhei novamente para aquele corpo que ali estava esticado abaixo de mim, observei atentamente e percebi que conhecia aquela pessoa, tentei lembrar e como se um véu branco e opaco saísse de defronte dos meus olhos, e se rasgasse em milhões de pedaços, reconheci aquela pessoa. Fiquei amedrontado, desnorteado e comecei a chorar, chorei porque conhecia aquela pessoa que estava esticada abaixo de mim, comecei a perceber que tudo fazia sentido, o quarto, a mobília, a arrumação bagunçada, aquela pessoa.
A voz continuava a martelar minha cabeça, desta vez tão forte que fiquei sem saber o que fazer, como se algo me paralisasse.
Aquela pessoa que estava estirada sobre a cama, era “eu”, aquele quarto e todo o complemento e seu conteúdo, eram meus; estava deitado, não sei se dormindo ou morto, estava liberto de meu corpo, me sentia aliviado, porém aquelas vozes me pediam para voltar, pois não era ainda a minha vez de partir, a minha vez de deixar este mundo.
Fiquei prestigiando aquela dolorosa cena e percebi que estava ligado a um fio, algo parecido com uma nuvem, fina e comprida, a qual ligava meu corpo àquela massa etérea que era eu naquele momento.
Percebi que estava só, porém angustiado, apareceram muitas pessoas ao meu redor, rindo, chorando e me pedindo para se soltar e vir com eles, deixar aquele corpo e ir com eles, desbravar e conhecer o mundo, porém algo em meu coração dizia que não, enquanto eu tinha vontade de me libertar. Vozes de todas as direções diziam coisas distintas, umas para voltar, outras para me soltar. Uma confusão grande surgiu em meu pensamento, e então soltei um grito estridente, o qual me fez voltar imediatamente ao meu corpo, pelo menos achava que ainda me pertencia. Acordei apavorado e sentei sobre a cama, estava banhado de lágrimas e suor, não sabia se fora tudo sonho ou uma visão que irá vindouramente acontecer. Aquela noite parecia uma eternidade, olhei para o relógio, estava escuro, mas a luz que entrava vergonhosamente pelas frestas das telhas iluminava o quarto, decidi num grande ímpeto acender a luz e o fiz, peguei o relógio que descansava sobre o birro esquerdo da cama e vi que era ainda 01h00min da madrugada, ou como aqui muitos chamam “madrugada nova”. Esta noite secular, me deixou pensativo e sem forças para levantar, parecia que algo sugara as minhas forças de tal modo que não podia mais me mover, parece que gastei o resto delas para acender a luz.
Deitei novamente, e de um grande impulso, levantei e percebi que tudo estava claro, um calor intenso se postara, os pássaros cantavam arduamente anunciando o desabrochar da grande rosa no horizonte; peguei o relógio e fiquei boquiaberto, eram 09h00min horas da manhã, a luz estava apagada e uma gargalhada involuntária rasgou de minha garganta. Apavorei-me ao lembrar de tudo e também por ter soltado aquela grande gargalhada estridente e amedrontadora.
Fiquei imóvel, e então me lembrei das sábias palavras de “Chico Xavier”:
“Não te preocupes, pois, amanhã será outro dia”; as quais eu lera outro dia. Levantei-me, fiz as coisas de praxe e passei todo o dia calado e pensativo, fiquei com medo, e a partir deste dia nunca mais fui o mesmo, penso agora diferente sobre as coisas do mundo e ando mergulhado entre minhas tristezas, sempre procurando refúgio nas sombras e resposta no silêncio.
As pessoas não entendem o que se passa entre você e seus sonhos, há mais coisas entre o céu e a terra do que podemos imaginar.
Valteones Rios
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